Olga Maria Castrillon-Mendes
Rubens de Mendonça percorreu grande parte das searas da criação humana.
Fez História para conhecer-se e conhecer a sua terra natal e o seu Estado, na tentativa de integrá-lo no cenário nacional. Foi um dos vanguardistas de Pindorama, revista de crítica e literatura (1939) que sustentava a existência da cultura entre dois polos: de um lado a rotina, a desmoralização, a pasmaceira, a agonia. Na outra margem os espíritos sedentos de novidades, a vida, o movimento, a energia. Sempre duas gerações 1 que se combatem, que se mutilam, que se destroem.
Mesmo estando há mais de uma década em descompasso com o movimento da Semana de Arte Moderna (1922), o sentimento de renovação das letras, em Mato Grosso, se fazia sentir por iniciativa dos intelectuais sedentos de novidade e atualidade do fazer literário. Os grupos formados por Gervásio Leite, Rubens de Mendonça, J. B. Martins de Melo, de Pindorama, somado ao Manifesto do Movimento Graça Aranha, com Lobivar Matos e Sarã, com Wlademir Dias-Pino, Rubens e Othoniel Silva, imprimiram a crença no espírito de solidariedade e de 2 compreensão pela integração dos homens de letras .
Simbolica e paradoxalmente, as designações dos movimentos estão nas raízes do sentimento de brasilidade: o primeiro refere-se ao primitivo nome das míticas terras brasileiras; o segundo liga-se aos princípios revisionistas nacionais, patrocinado por um dos mais significativos escritores brasileiros da ruptura, Graça Aranha e o último, lembra a planta aquática cuja função é proteger, pelas margens, propiciando, também, a correnteza. Nessa dinâmica e singular expressão o objetivo básico era congregar intelectuais e difundir o dinamismo criador, como o que se vem sentindo nos últimos anos em todos os setores da vida, em Mato Grosso.
Nessa perspectiva a vigorosa figura de Rubens de Mendonça se reatualiza. O polígrafo foi, por quase meio século de produção, coerente com as propostas vanguardistas que defendia. O conjunto de sua obra comprova que em variadas fases da história cultural de Mato Grosso retoma as suas entusiasmadas crenças, mesmo que muitas vezes capituladas: o gosto pelas coisas do espírito, o movimento do pensamento na criação:
Não visamos movimento de intolerância ou lutas estéreis sem objetivos altos. Não queremos separar, mas unir. Não queremos combater, mas criar. Não queremos restringir, mas libertar. Em suma queremos integrar os homens de letras, os intelectuais, os artistas nessa obra de renovação [...] (ibidem, p. 135, grifos meus).
Exemplo da postura integradora de Rubens é a sua presença no interior de Mato Grosso, ao participar da História de Cáceres: administração Municipal, de Natalino Ferreira Mendes, em 1973.
O prefácio é um libelo que se presentifica. É o historiador com os olhos do presente, mas voltados para o futuro das letras mato-grossenses. Fala da necessidade de estudiosos começarem a escrever a história de seus municípios, com fatos locais somente conhecidos em sua província, para se compor uma História do Brasil. Acusa, ao mesmo tempo, o penoso ofício do escritor interiorano que depende basicamente do apoio do poder público ou de iniciativas individuais para divulgar a sua obra. Como fala Manuel Diégues Júnior é pena que muita coisa interessante, valiosa, expressiva, apareça pelos Estados e se mantenha ignorada dos grandes centros (Catálogo de exposição, p. 61).
Ao descentralizar a cultura, Rubens imprime o seu caráter característico que a distingue das demais. Retoma a crença no coletivo, na necessidade de formação de grupos intelectuais que possam ser reconhecidos por consensos internacionais, que conheçam e socializem as produções locais modelares da vida do povo: da origem comum (Pindorama) a outras fontes renovadoras (Graça Aranha e Sarã), respondendo a critérios universais.
A reatualização da ideia de movimento, aliada à busca, no caos, do equilíbrio entre a tradição e a novidade, transforma a figura basilar de Rubens de Mendonça num necessário revisitar que as comemorações do centenário têm proporcionado.
Antonio Candidovao referir-se à fase de formação da Literatura Brasileira diz que, comparada às grandes literaturas, a nossa é pobre e fraca, mas é ela e não outra que nos exprime (CANDIDO, 1997, p. 10). Unidade e diversidade convergem entre si o caráter multiplicador que recortam traços comuns, estabelecendo mapas da conformação social de uma comunidade. A produção de Mato Grosso é a mais lídima expressão do que se conseguiu expressar, como marca da cultura e dos processos identitários, que se somam ao grande poder de adaptação própria do brasileiro, como se pode atestar pelo percurso histórico do processo de colonização e de formação da cultura. A função social da obra literária resulta do compromisso da expressão com que Candido trata de continuidade, isto é, a pressuposição da transmissão e de uma herança que signifique a integridade do espírito criador na dimensão do tempo da qual dependem a intemporalidade e a universalidade da obra (CANDIDO, 2000, p. 140).
Culturalmente falando, Mato Grosso se fez conhecido como Estado periférico, apanágio da periferia por ela mesma – movimento endógeno de produção cultural – que acaba por implodir qualquer manifestação de caráter mais abrangente. E o é, não só em relação ao panorama nacional, mas também nos seus aspectos internos. Pouco se conhece, principalmente nas escolas (e também nas Universidades), sobre a - 12 - produção cultural mato-grossense. E se não há conhecimento, não há divulgação, não se faz leitor, não se constrói a crítica e não se participa do mercado editorial, forte aliado do sistema de produção e de implantação do cânone. Isso significa dizer que em diferentes temporalidades, os intelectuais matogrossenses reafirmaram a preocupação de tornar visível a produção existente fora do eixo central, mesmo porque o universo cultural de um país não se dá apenas pelas ações emanadas do centro de poder, mas também e, principalmente, pelas suas margens. Por isso, o prefácio de Rubens de Mendonça como intelectual empenhado e na crista das vanguardas, pode ser relido hoje como importante peça na luta contra o cânone.
Ao lado do amigo Gervásio Leite com quem compôs as faces da nova escritura em Mato Grosso, procuram saber, conhecer o que está perto, aquilo que envolve o lugar em que estão por primeiro para depois buscar o que está mais longe, como a eles 3 se referiu recentemente Marília Beatriz .
Em certa medida, as palavras que abrem a História de Cáceres, sempre me soaram como um Sermão aos Peixes, a vertente jornalística que constituiu meu primeiro contato com a escrita de Rubens de Mendonça. Os Sermões rubianos chegavam até nós através do Jornal Diário de Cuiabá dos anos 1970 e 80. Com eles fazíamos alusão ao Sermão de Santo Antonio aos peixes, de Padre Vieira, criticando, em 1654, a prepotência dos grandes que vivem de os "engolir" e "devorar", como os peixes grandes fazem aos pequenos. O alvo eram os colonos do Maranhão, que no Brasil eram grandes, mas em Portugal "acham outros 4 maiores que os comam, também a eles" . Em que pese a distancia temporal, a atualidade temática, também política, está presente nos Sermões jornalísticos de Rubens. Entre os preceitos bíblicos e a 3 Cf. Curso de Literatura Mato-Grossense Vanguarda na Literatura, ministrado pela Acadêmica Marília Beatriz de Figueiredo Leite, na AML, dia 21 de março de 2015. 4 Vieira. Sermão de Santo Antonio aos peixes. www.bibliotecavirtual.org.br - 13 - observação cortante da sociedade, a metáfora transforma o mundo real em literatura.
Crônicas mais que atualizadas, pois os homens não mudaram tanto e também não conseguiram, ainda, construir o melhor dos mundos almejado pelo cronista. A ironia e riqueza de sugestões alegóricas, aliada ao agudo senso de observação sobre os vícios e vaidades do homem, comparando-os aos peixes são de grande riqueza conceitual. Por isso, o universo de produção de Rubens é atual, ainda instiga a pensar, mexe com os lugares-comuns da história social, atualiza seus temas, metaforizando o mundo. Desde os populares Sermões é o poeta que fala. Não apenas utilizando os jogos de palavras, mas o toque social em que o escritor clama por dias melhores e cidadãos mais conscientes. Que homem se escondia naquelas palavras de desassossego E, melhor, que leitores atingiam o garimpador da história de Mato Grosso, colocando-se sob as lâminas do bisturi social É pelo conjunto da obra em que subjaz a crença no poder transformador dos grupos, apregoada desde os periódicos de vanguarda, que se configura a máxima amplitude do escritor que traduz a sociedade em componentes básicos lidos aqui 5 como proposta de um projeto histórico-literário para Mato Grosso . As duas vertentes básicas – historiador e poeta – sedimentam uma concepção culturalista que envolve critérios políticos e estruturais, dando espessura e verticalidade ao seu papel de professor. É como um educador de gerações que pensa Mato Grosso: da Evolução do Ensino em MT, do crítico literário, em Aspectos da Literatura Mato-grossense, dos ensaios críticos sobre o romântico satanista Álvares de Azevedo e do poeta da pátria Olavo Bilac, das raízes mato-grossenses presentes nos poetas bororos; do folclorista das Estórias que o povo conta; Sagas e crendices da minha terra natal e dos Cadernos cuiabanos. Toda sua capacidade poético-narrativa sedimenta as várias facetas da história de Mato Grosso, desaguando na enxuta prosa jornalística. Se pensarmos, portanto, a produção cultural apenas pelo legado de Rubens de 5 Aspecto ainda em estudo sobre o papel dos intelectuais em Mato Grosso. - 14 - Mendonça, como é possível conceber a margem da produção de/em Mato Grosso Uma região do porte e importância da nossa, entroncamento de rios, passagem e saída para o mundo latino-americano, centro geodésico, não fazer parte do cenário intelectual dos centros de excelência Costumamos cobrar do poder público iniciativas de caráter cultural. Será que fazemos o nosso papel de leitores e divulgadores da nossa própria produção Hoje, apesar de não se ter alcançado o patamar ideal do acesso às obras existentes e às facilidades de publicação, o que nos coloca na mesma situação denunciada por Rubens na década de 1970, crescem em número e qualidade as obras de criação, as dissertações, teses e artigos voltados para temas de interesse local, numa perspectiva cada vez mais abrangente de um macrossistema latino-americano. O papel exercido pela Academia Mato-Grossense de Letras, pelos Institutos Históricos, tanto o de Cuiabá, quanto os de outros municípios, e pelas duas Universidades públicas do Estado, a Federal e a Estadual com sede em Cáceres espalhadas em todas as regiões do Estado, tem sido fundamental na implementação das pesquisas voltadas para os assuntos afetos à formação e à compreensão das identidades plurais que nos constituem. Esse fato tem despertado o interesse de outras Instituições do país que se voltam para a novidade do material ainda inexplorado do nosso laboratório de pesquisa. Nessa nova geografia cultural, Mato Grosso adquire uma perspectiva sociocultural que permite, como diz Ángel Rama reconstruir com maior rigor o funcionamento da sociedade regional, pois aos valores comuns que a impregnam por meio de um longo processo evolutivo,se agregarão os diferenciaisclassistas ou setoriais queesboçariamsubculturasdentrodeumacultura(RAMA,2001,p.289). Novas características vão sendo impressas à produção acadêmica, à construção do perfil, à vocação das Universidades enquanto gestoras do projeto de desenvolvimento sociocultural do Estado e, principalmente, à função do intelectual mato-grossense no cenário brasileiro. - 15 - Entre essas e outras questões, os fenômenos começam a ser interpretados.
Resta-nos imprimir neles as características orgânicas de sistema para que haja possibilidade de descobrir os critérios estéticos que poderão construir a nossa literatura. Garimpando entre cascalhos poéticos Rubens, poeta, conheci bem mais tarde, remexendo os arquivos porque só me interessava pelo Rubens dos peixes. O destemido crítico dos costumes, da ignorância, das posturas políticas, reforça a coerência com a as propostas iniciais impressas nos movimentos de vanguarda. A simbologia dos peixes era suficiente para povoar a imagem que guardava dele. Uma habilidade retórica que lhe deu a garantia da manutenção dos valores pelos quais se pautava. Trazer Rubens de Mendonça neste momento das comemorações do seu centenário de nascimento é abrir possibilidades de enfoques em que flui a base da escrita jornalística, cuja essência poética demarca as dicotomias que permeiam o conjunto de sua obra. Como jornalista, foi poeta, cuja vertente pode ser sintetizada no terceto:
No 'Escafandro da vida' e cheio de ambição, / Mergulho a revolver 'Garimpo do meu sonho', / Para somente achar 'Cascalhos da ilusão...' ,
títulos antológicos de 6 seus poemas mais conhecidos, publicados entre 1939 e 1954 . A poesia, portanto, está na gênese do historiador. Este é o garimpeiro que conta a memória (da história das revoluções, do poder legislativo, da Rusga, do Comércio, das ruas de Cuiabá, do humorismo da política mato-grossense). O poeta, assim, é a alma que conta e canta o passado, nutrindo-se da metáfora, como fala Pedro Dorileo em Uma palavra ao Catálogo de Exposição (1982): 6 Carlos Gomes de Carvalho. In: Poetas românticos, 2009, p. 175-292. - 16 - E, então, a poesia é uma síntese durável de imagens aparentemente factíveis [...], traz ela sempre a carga da matéria que, transcendendo e se confundindo com a imagem material, busca a profundidade, a intimidade substancial que dá sopro de vida à metáfora. – Daí porque estou com o pensamento: - O poeta é o mais fiel historiador – admirável sincretismo de Rubens de Mendonça, cuja alma projeta a poesia e nos conduz à história (Catálogo de Exposição, p. 2). As metáforas rubianas surgem carregadas da sensibilidade poética de que é plasmado o seu sagaz espírito cuiabano. É o poeta que compreende a parte no todo, ou seja, acessa o mundo a partir de Mato Grosso, por isso, há em sua obra aquela necessidade premente de transformação e constante vir-a-ser. Recria o passado sem, contudo, reduzi-lo ao localismo, mas imprimindo nele o espírito da novidade, do movimento e da energia, preceitos básicos dos movimentos de vanguarda, como vistos. Como poeta projeta o olhar para um horizonte de expectativas em que Mato Grosso é construído pelo conjunto de olhares, cujos focos brotam de todos os lugares, de todas as regiões culturais que constituem o complexo sócio-histórico-cultural brasileiro. E isso não seria muito se pensarmos na base jornalística da sua escrita. Clareza, simplicidade, exatidão e variedade, o rigor e a competência, a correção e a elegância narrativa adquiridos no contato com documentos e exercício coerente de árduo trabalho escritural.
Nesse sentido, pode-se ver, em Rubens, a preocupação investigativa e a consciência social atenta que caracteriza o interesse coletivo e atualização da postura criativa, como se vê nos versos de Rusga: noite de maio de 1834: - 17 - [...] balas a sibilar... noite atroz... agonia... Só o troar dos fuzis e a voz da ventania, O silêncio a corta, de momento a momento. E besta gira de dor, ia de porta em porta, O bispo D. José, pela cidade morta, Levando alívio e paz a cada sofrimento (Garimpo do meu sonho) À parte o sentimento romântico que perpassa a maioria dos poemas iniciais de Rubens, a tonalidade historiográfica aliada à posição das personagens que movem o cenário sociocultural demarcam o lugar de onde o poeta acessa o seu mundo: [...] E eu, assim, a lutar, busco o verso perfeito, O dinamite sem jaça, a pedra sem defeito, Carbonado gentil da minha inspiração... Mas só pude encontra nos versos que componho - Filhos da minha dor Garimpo do meu sonho Onde só pode haver – Cascalhos da Ilusão... (Cascalhos da ilusão) A luta é a palavra de ordem por onde o poeta extravasa os sentimentos de esperança ou desilusão; de crença no homem, ou do poder que pode exercer na comunidade:
[...] E por isso eu acreditei na bondade humana.
tudo era poesia na manhã clara e risonha.
o homem,
a terra,
o sol,
tudo era um poema
Era o poema da luz,
quando a manhã veio clara e risonha
como um arco-íris cantando dentro da minha alma
(Cascalhos da Ilusão).
Pelas searas do folclore, Rubens percorre o sentido do imaginário como fonte de transformação, acreditando que o ritmo novo que se busca reside na alma do povo, lugar de possibilidades da realização artística:
[...] Saci Pererê
agora pôs fogo nos versos antigos dos velhos poetas,
não quer mais saber de pálida e loira, nem sabe de métrica
nem gosta de rima,
Saci quer poesia, poesia nascida da alma do povo,
da gente da rua que luta e que sofre.
Negrinho teimoso, negrinho danado só anda a dizer que é modernista
Saci Pererê
Você é a poesia, a nova poesia do novo Brasil (Dom pôr do sol).
O exercício poético leva o poeta à síntese temática. Cada vez mais, ao estilo de uma notícia de jornal, as palavras dão lugar aos sentidos silenciados, como em Greve e Trovas:
Veio a polícia.
Houve tiros.
Depois só ficou um trapo de camisa do operário,
sujo de sangue,
como se fosse bandeira vermelha
a tremular no ar... (idem).
Trova do povo Poesia
de simples inspiração
Mas contem quanta ironia
se castiga um medalhão (idem).
Haikai, rondó, elegia,
até o soneto passa
Só fica a trova – poesia
que é a alma da nossa raça. (idem).
Poetando livremente o poeta adquire o poder da síntese e da ironia. A discrição romântica cede lugar ao histórico e à minimização dos versos, cada vez mais distantes da forma parnasiana. No horizonte da realização literária o fazer poético se liga ao manifesto, cujas bases de renovação imprimiram novas posturas nas letras.
Sem perder de vista essa ideia norteadora, que pressupõe a existência de uma produção literária ligada ao conjunto das manifestações nacionais, pensar a obra de Rubens de Mendonça fez emergir elementos da diversidade regional, os aspectos literários e extraliterários, colocando-os em sintonia (ou confronto) com o tempo e a história de que fala Mário César Silva Leite (LEITE, 2005, p. 223). Não é, portanto, pensar um discurso hegemônico sobre o mesmo, mas o diferente e em relação ao outro, a outras comunidades. Desta forma, é evidente a ligação de Rubens com as discussões sobre Mato Grosso, recriando a experiência que fez, do Modernismo, uma estética que contribuiu para sedimentar o nosso modo particular de ver e de sentir o mundo. O projeto de construção de uma cultura nacional, iniciada no Romantismo, foi retomada no Modernismo pela atuação preponderante de Mário de Andrade. Os temas nacionais, proliferando-se por todo Brasil, se voltam para os espaços mais interiores tidos como originais. A multiplicidade regional que compõe o caldeirão de culturas marcou a fase do amadurecimento de um sentimento íntimo de nacionalidade e de individuação nacional, de que trata Antonio Candido.
Mato Grosso, plugado nos movimentos transformadores do cenário brasileiro das décadas de 1970/80 gerados, principalmente dos programas governamentais e pela oferta de terras devolutas produtivas existentes no interior, o cenário amazônico, transformado por incentivos federais, surge como forte aliado do processo de desenvolvimento cultural. Integrar a Amazônia significava a integração de Mato Grosso ao resto do Brasil. A UFMT é criada nesse contexto e a poética de Silva Freire soa representativa do fenômeno literário e linguístico da maior autenticidade no reconhecimento das raízes mato-grossenses e que ficou conhecido como cuiabania.
Como explica o próprio Freire, um sentimento, mais que um movimento cultural do processo de formação da identidade mato-grossense, defendido pelo grupo 7 revolucionário do escritor . Assim se expressa o poeta sobre esse conceito: mas o que é cuiabania, afinal, poeta / não é topônimo, é a sensação indizível, esse charivari de maçaroca-poética, daqui e daqui-prá-frente, de quase três séculos de uma cidade 8 mágica... .
Tais fenômenos culturais envolvem questões externas, mas também internas, porque obedecem ao tempo histórico e tem a ver com domínios ideológicos, privilégios, facilitações, que apagam ou dão brilho a figuras e obras que fizeram parte da lista dos visíveis. Ou seja, os fenômenos socioculturais contribuem para a fixação do cânone literário. O exemplo contemporâneo mais notável desse fenômeno é o do 9 poeta Manoel de Barros , cuja magnitude da obra contribuiu para garantir a supremacia do Pantanal no cenário nacional e internacional.
Como atuante pesquisador, Rubens de Mendonça enveredou pelos caminhos da história factual, inserindo nela a história da literatura, pioneira na compilação de escritores saídos dos inexplorados arquivos públicos e privados, muitos deles acessíveis, hoje, na forma digital, através da curadoria da Casa Barão de Melgaço.
Abre-se, com isso, novos pontos de partida para se pensar possibilidades (ou não) da existência de um sistema literário em Mato Grosso, cujo sentido vimos perseguindo.
Instigante figura do cenário brasileiro, os vários estilos percorridos por Rubens de Mendonça ainda permanecem pouco explorados. Da temática histórica, passando aos dicionários biobibliográficos, estudos do folclore, antologias, narrativas ficcionais, versos e ensaios literários, configura-se uma atuação fecundante na ambiência sociocultural de Mato Grosso. É possível perceber o estilo jornalístico na gênese do seu exercício escritural, como visto, cuja flexibilidade imprimiu no conjunto da obra, a necessária profusão do espírito, conformando o intelectual cônscio do seu papel na sociedade.
É possível percorrer a escrita de Rubens, cartografando a história de Mato Grosso em seus aspectos políticos, sociais e culturais. É um garimpeiro dos bastidores em que a história ganha um ar de acontecimento dialético. É, sobretudo, no jogo de contrastes entre os acontecimentos históricos e os perfis humanos que se desenha um narrador-observador em prosa enxuta e unificadora de um imaginário em prol da manutenção da consciência histórica, sem perda do senso crítico.
O evento Centenário de Rubens de Mendonça é um desses caminhos que aponta para nos dizer que há muito trabalho a ser feito rumo à revitalização do conjunto da sua obra.
Urge, portanto, que se formem grupos de trabalho em que se possa traçar novos rumos na política sociocultural do Estado, a partir de programas verticalizados e pensados para além de uma simples comemoração, mas ficam como marcos de novas fontes a serem investigadas, contribuindo para a interpretação dos fenômenos que compõem a literatura brasileira.
Parabéns pela profícua iniciativa aqui representada pela filha Adélia Badre Mendonça, por sua atitude de desprendimento e de partilha tão necessários aos novos tempos. Seu empenho coloca-nos face à grande responsabilidade de trabalhar em prol da socialização da vasta obra de Rubens, assim como de outros intelectuais de Mato Grosso.
Agradeço a oportunidade que me foi dada de ser co-partícipe deste novo tempo nas letras mato-grossenses.
REFERÊNCIAS
BARROS, Manoel de. O livro das ignorãças. 2 ed. RJ: Civilização Brasileira, 1994.
CANDIDO, Antonio. Formação da literatura brasileira: momentos decisivos. BH/RJ: Itatiaia, 1997
CANDIDO, Antonio. Literatura e sociedade: estudos de teoria e história literária. 8 ed. São Paulo: T. A. Queiroz, 2000.
CASTRILLON-MENDES, Olga Maria. Rubens de Mendonça: um projeto para revitalizar as letras mato-grossenses. In: MENDONÇA, Rubens. História da literatura mato-grossense. 2 ed. especial. Cáceres: Ed. UNEMAT, 2005, p. 209-213.
FREIRE, Silva. Águas de visitação. Cuiabá: Edições do Meio, 1980.
FREIRE, Silva. Catálogo de exposição. Imprensa Universitária. Cuiabá, 1986.
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